“Ao exigir do artista uma atitude consciente em relação ao seu trabalho,
você tem razão, mas confunde dois conceitos: a solução do problema e a
colocação correta do problema. Apenas o segundo é obrigatório para o artista.
[...] Um tribunal é obrigado a colocar as questões corretamente, e que os
jurados resolvam, cada um à sua maneira.”, Tchekhov.
Em maio de 2010, “Memórias de
Xangai” foi apresentado em Cannes, Jia
Zhang trabalhava com a China contemporânea até então, e por isso o passado transformar-se-ia
em seu foco naquela produção, os confins da História talvez guardassem a razão
de tudo o que o diretor abarcava em sua obra. Dessa maneira, Memórias de Xangai
pode ser visto como um documentário clássico, pelos depoimentos no pretérito e
por uma estrutura de entrevistados constantemente remetendo à suas histórias, a
construção histórico-sociológica chinesa, idas e vindas de pessoas exiladas em
sua própria terra, é observada a partir do prisma e história pessoal de cada um
dos entrevistados, Yu Lik-Wai,
diretor de fotografia há tempos trabalhando com Jia, explora cuidadosamente
paisagens antigas e contemplações contemporâneas, paisagens que flutuam e enquadram
o humano também, e quando a câmera se volta para a face das pessoas é de uma
elaboração riquíssima- Yu e Jia não
partem da riqueza estética, mas sim enriquecem a preciosidade dos relatos que, em
última instância, comprovam uma vida e um passado.
Jia parte de Xangai, e pela óbvia
complexidade que é abarcar a formação constitutiva de uma cidade, o diretor
esbarra em questões inerentes à existência da arte, por isso outras cidades
serão destinos-temporários nessa paisagem de observações contemplativas que é o
filme, paisagens que nascem de uma necessidade de testemunhas das duas Xangais, uma recente, a outra constituída
(ou inventada!) pelas memórias, os destinos-temporários que são essas outras
cidades mencionadas, de testemunhas que ficaram exiladas em outras cidades
distantes de Xangai depois da Revolução Cultural. Jia maximiza o conceito
inicial não por simples estética, mas por analisar que não basta só exibir uma
cidade para desvendá-la, é necessário testemunho e imagem e cinema, em todas as
adições possíveis e de todos os ângulos disponíveis, portanto não basta se
resumir nas localidades de Xangai para falar sobre Xangai. Contemplando planos justapostos, como memória que tem
um ponto de partida para se perder como o fantasma que perambula por um
presente onipotente.
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