A relação entre morte e vida é
óbvia. Recentemente, Juçara Marçal decidiu-se lançar solo, mas o que realmente
surpreende aqui, é que ela traz elementos que eu ainda não havia identificado
em sua música. Protegida por uma discografia de destaque ao lado de grandes
nomes, o disco novo tem muita força própria e é prévio candidato aos melhores
álbuns do ano.
Mas é óbvio que toda essa
discografia não se sustentaria sozinha, era preciso arriscar. Para Marçal,
interessa demais subverter as regras (?) ou estruturas tão tradicionais da
música popular brasileira, e pra isso ela utilizou de certa dose de amor por Patife Band, Arrigo Barnabé, Letícia
Garcia. Com antecedentes assim e sua própria história dentro da música,
Juçara mais uma vez se reinventa ao apelar para a redução de instrumentos, que
mesmo assim não se omitem a cacofonia, ruídos, barulhos, experimentalismos.
Assim, Marçal renasce com sua
potencia vocal. É uma obra muito bem elaborada com letras invariavelmente
rondando o definhamento, o aniquilamento e a destruição. Em suma, ela não tem
medo de pegar melodias já conhecidas, relativamente famosas, e deixá-las ao
doce julgamento de sua voz. A questão é que a cantora tem uma personalidade tão
forte e interpretações corajosas e audaciosas.
Esta exposição deixa Marçal mais
acessível, sem barreiras complexas para comunicação com ouvintes. Há diversas
ramificações, cenários e alternativos para as versões incorporadas, que tem um
grande apelo popular, embora ainda sob o “estranho” que habita o universo de
Juçara. Existe essa acessibilidade que é possível perceber logo no inicio do
disco, preparando para o que vem a seguir. A música vaga pelo samba, MPB e,
claro, a vanguarda paulista.
Assim, ela está livre para
interpretar as canções fora de qualquer acordo prévio, criando melodias são
completamente singulares. As músicas revelam Juçara explodindo alucinadamente.
Surpreende que tão poucos instrumentos retratem incrivelmente bem a dimensão
visceral que Marçal utiliza na fragmentação de harmonias. Mas não se enganem;
essa modulação tem todo um efeito cênico dentro do disco.
Podemos perceber instrumentistas
bem alinhados, confortáveis com o espaço alheio. Porque Juçara transita entre o
acessível e o essencialmente torto, os músicos providenciam o tipo de
ambientação que segue essa coerência, e conseguem. Ou seja, um passo muito
corajoso para a música nacional, confirmando nossa excelente produção que a
todo o momento- seja por que raios for- queremos estar dando como morta.
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