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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Rádio Morto- Escatologia Poética [2014]




Uma classe média cafona, travada, vivendo em prisão domiciliar, com os periquitos, os cachorros e os gatos castrados”, Fernanda Torres.

Ao ouvir Ratos Mortos, já somos contaminados pela hibridez que o Rádio Morto apresenta em seu último disco (o “grupo” aparentemente acabou), podemos ver esse álbum, então, como uma ode à morte.

O disco tem odor de noite, aqueles rolês fétidos e sombrios no centro de São Paulo durante a madrugada, como mostra a faixa de abertura, Ratos Mortos. O Salvador apresenta uma ambientação esquizofrênica, e um confronto entre crença/niilismo. No início temos uma roga a Deus para que a salvação ocorra, para no final ele pedir a liberdade do próprio salvador, de suas amarras morais e fundamentalistas.

Misantropia começa lenta, obscura, até a entrada dos tiros e dos beats de hip hop. Junto com essa levada de rap, há uma sonorização que oprime a voz, enquanto sons referentes a uma catarse urbana podem ser ouvidos.

A atmosfera de O Pesadelo é totalmente obscura, pesada, arrastada; os vocais são quase como uma assombração e a música poderia ser a trilha sonora para definir o que é sinistro. O Silêncio parece que é baseado em um conto que Raphael Mandra (quem encabeça o Rádio Morto) escreveu; mesmo clima pesado, arrastado, contrabaixo deixando a atmosfera incompreensível. Vale a pena prestar atenção na letra, a melhor do álbum.

Gótica Profana tem clima industrial e sons tensos, com o baixo completando a coisa toda, muito soturna. Carnaval no Cemitério: o título diz tudo, um carnaval sinistro com batuques de percussão, por baixo sons que lembram a morte, assombrações.

O niilismo entra com tudo em A Caveira, música que constata nossa nadidade originária. Musicalmente, é um dark ou freak folk, com o vocal praticamente falado, agredindo o ouvinte verbalmente a todo instante.

O desejo de redenção é o tema de Paisagem, música semiacústica que conta com escapadas e ecos suspensos em uma letra onde o espírito almeja os “grandes céus”. A letra de Psicofuga associa-se muito forte ao som, esquizofrênica, fala sobre desejos, enquanto ouvimos estalos fortes no plano de fundo e um alto e claro “foda-se você”.

Ave Negra é lenta, cadenciada, cheia de chiados, que me faz pensar em contos débeis e doentios. O Funeral contém uma letra muito forte, prossegue o ritmo mais lento da música antecessora, enquanto numa negatividade suprema, Mandra afirma “meu funeral é só um deus desconhecido”.

Ad Eternum fecha o ciclo; um drone com baixo crescendo, alguns movimentos e escapes bem orgânicos, construindo o muro sonoro para vozes indecifráveis. Depois dessa jornada calcada em uma obscuridade, em que esquizofrenia, misantropia, sexo, morte e redenção são explorados com um viés completamente único, parece que é o fim do Rádio Morto. Ao menos pelo que encontrei pela internet, uma pausa indefinida. Valeu Rádio Morto, as produções caseiras, o lo-fi remoto e aqueles que têm medo e ódio agradecem.

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