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quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Aaron Schneider- Segredos de um Funeral (2010)- A Experiência da Solidão



O que nos outros chamamos de pecado, para nós é experiência.”,Ralph Waldo Emerson.

Com a barba emaranhada de um profeta, cabe ainda a Duvall uma certa máscara de homem denso e profundo, pelo menos ao público que frequenta seus filmes, um homem que inspira respeito e até certo medo, o que não significa portar um coração gelado. Nós nos inclinamos através dele, buscando aprender mais, apenas para descobrir que seus segredos não serão rendidos tão facilmente. Por isso o sorriso de Duvall: não é bem legível, e nunca muito distante, divertindo-se com a nossa dependência do show instável do mundo, e pelo seu próprio lugar surpreendente no centro do palco.

Em Segredos de um Funeral, ele interpreta Felix Bush, que mora sozinho no bosque, em Tennessee, cozinhando coelhos e cortando madeira. Mais cedo, nós o vemos mudando um sinal em sua propriedade de “Não Ultrapasse” para “Droga, Não Ultrapasse”, o que é uma maneira bonitinha de nos dizer que há um grosseiro de primeira ordem. Quando ele se aventura na cidade mais próxima, alguém arremessa uma pedra nele, e a velocidade com que o velho homem pega e bate no culpado sugere que a idade não o murchou, mas o endureceu. Felix é o tipo de camarada que se levanta na escuridão para espreitar através da chuva porque esqueceu de alimentar sua mula. Adormecendo no estábulo, ele acorda em uma manhã puramente azul, e conversa com o animal mudo como se fosse a única companhia que precisasse.

A tarefa de Segredos de um Funeral, que foi escrita por Chris Provenzano e C. Gaby Mitchell, e dirigdo por Aaron Schneider, é chamar o carrancudo Felix do seu covil. Ele visita um salão funeral, dirigido por Frank Quinn. “Eu estou atrás de um funeral” Felix diz. “Rapaz, você está com sorte” responde Quinn. Nós estamos nos anos trinta, e os tempos não são menos difíceis no comércio funeral do que nos outros. “Uma coisa sobre Chicago: as pessoas sabiam morrer” Quinn diz de seus dias mais felizes. Quando eu lhes disser que Quinn é interpretado por Bill Murray, vocês podem ouvir instantaneamente o tom de sua voz girando na sua cabeça, ao mesmo tempo mal-humorada e energética. A grande descoberta que Murray doou ao cinema é que a droga do inexpressivo não precisa ser necessariamente um infortúnio; ao contrário, pode ser um bônus, mesmo quando você claramente tem um montão de coisa para se preocupar, mais uma face que se assemelha a um velho dinarmaquês. É uma ameaça ver esse humor deslavado contra a severidade de Duvall.

Além disso, Felix quer estar vivo e presente nos discursos de seu próprio funeral. “Eu quero que todos ,que tenham alguma história para contar sobre mim, apareçam” ele declara, nesse ponto é indicada uma pequena fresta para visualizar o que há no interior de tão fechada caverna. “Há milhares de anos atrás ele era o homem mais interessante que eu havia conhecido” a viúva diz, e agora Felix começa a reacender esse interesse, enfeitando a si mesmo, convidando os moradores da cidade para participar do serviço, e viajando através do estado para desterrar um pregador idoso que falará no seu funeral. Até haverá uma loteria, cujo vencedor herdará a terra de Felix.

Em resumo, nosso ermitão está ressocializado. “Um homem deve estar vestido com a sociedade, ou nós vamos sentir certa nudez e pobreza” Emerson escreveu, em um ensaio de 1857; chamado “Sociedade e Solidão”, e o filme de Schneider pode ser tomado como um ato de obediência a esse decreto. O vestuário é literal; metade das personagens que estão estranhamente gordos para uma época pós Depressiva (após o rompimento da bolsa em 1929), são revestidos de couro macio, golas de pele, e lenços de seda, tudo isso lindamente fotografado, por David Boyd, contra um fundo de fumaça cinza e marrons tonais. Mas para que fim a beleza serve? Isso não, como a exclusão total do roteiro do desconforto racial, acelera a suavização de um conto duro? Pensem no abrandamento, a graça quase dissecada com a qual Buñuel e seu homem câmera, Gabriel Figueroa, filmaram “No Deserto” (1965), outra saga de um espírito sem amigos. Buñuel permitia-se ser seco, satirizando os motivos acéticos elevados de seu herói, ao passo que um diretor como Schneider, embora fixado em um período detalhado, é totalmente moderno em sua sensibilidade, sua obrigação moral é trazer Felix de volta para o rebanho, como se a solidão fosse um insulto para nossos ideais comuns.

O funeral é um caso animado, ainda assim assinala a morte do filme. Há um carnaval a céu aberto, com comida sendo grelhada e música de violino tocada, Felix em grande parte no close up, toma o microfone e confessa um pecado antigo. Ele está totalmente sério, é claro, não mais propício a nos enganar, como se estivesse no sofá da Oprah (estranho que um filme com tantas possibilidades iniciais fosse tomar um rumo um tanto quanto capenga e à lá Hollywood). Mas um ponto que o filme levanta é; como alguém demasiado comprometido com sua consciência e seus princípios de ética se comporta ao agir paradoxalmente? Felix escolheu a solidão, e você?

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