“... e adivinhava
obscuramente que na renúncia estava minha única possibilidade de ser alguém”,
César Aira.
Esse grupo talvez tenha passado
os simples limites de “banda”. As letras afiadas de Patrick Kindlon sempre foram ótimas, mas depois do conjunto mudar
o nome (antes eles chamavam-se End Of A
Year), e lançar Try Me, sua
concepção criativa atingiu níveis que ainda não haviam sido escalados.
Kindlon sempre se destacou por seu desempenho e entrega nos vocais,
o problema é que anteriormente a banda não dava o apoio sonoro necessário para
sobressaltar mais ainda seu vocalista (e aqui não quero dizer que os vocais
necessariamente devam se sobressair, mas me parece uma proposta bem condizente
com o Self Defense Family). Isso já
vinha mudando gradualmente nos últimos dois anos- foram cinco EPs que já direcionavam uma roupagem
mais “casada” com esse determinado tipo de voz; a guitarra com frases levemente
distorcidas, um vocal feminino que suporta em situações específicas, a bateria
lenta.
Sei que você, caro leitor, que já
devorou as melhores bandas do que se convencionou chamar de “post-hardcore”, e pode estar se
perguntando “ok, mas se existem bandas no gênero como Touché Amoré, The Receiving
End Of Sirens e Drive Like Jehu,
por que iria ouvir justamente essa?” E embora o que eu diga aqui possa soar
pretensioso e louco (não que eu não o seja), o motivo é simples; porque Try Me é muito mais denso
artisticamente, apontando criativamente o cerne na problemática explorada pelo
álbum. Eu citei aquelas três bandas, mas poderia falar das mais cultuadas
dentro da suposta cena; Bluetip ou Frontier Trust. Cito essas bandas por
serem bandas que jogam o mesmo jogo, e, é claro, para falar do quão Try Me é único. E, obviamente, as apostas do SDF são as mais
altas.
Sempre que Dingo Fence começa, me sinto numa festa.
Embora a religião continue sendo
um tema importante para a banda, nesse disco há espaço para muitas outras
temáticas. Por exemplo, letras sobre a morte da pessoa amada, onde as pessoas
tentam fazer todo tipo de coisa para preencher esse vazio. Há muitas
influências de country também, como fica evidenciado no vocal meio folkzão de Patrick e, principalmente,
quando a voz feminina aparece.
Quando a prostituta é entrevistada
(tem duas faixas em que não há música, apenas a entrevista com essa mulher,
matéria-prima para o conceito do álbum) é importante não pular, porque faz
parte da experiência do disco como um todo. E vou parar por aqui e não
descrever essa entrevista para não estragá-la para vocês, acreditem, é fortee
parte essencial da experiência do álbum!
Try Me é um álbum muito profundo, relatando temas fortes, com uma
textura muito única- SDF é uma dessas bandas que conseguem deixar clara sua
marca logo de primeira. A reflexão proposta pelo álbum é brilhante, um
verdadeiro trabalho de arte.
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