Ouvir trabalhos como Music for Viola and Electronics II é algo recompensador. A interação
entre Michel e Oene, que se
conheceram na Cloud Ensemble,
entusiasma pela dificuldade dos temas propostos e como estes são tratados com a
densidade necessária. O tempo é estendido e seu andamento lento provoca
suspense, pela repetição dos sons eletrônicos, um verdadeiro drone, para inserções pontuais do
violino que, mesmo tentando evadir essa estrutura inicialmente rígida, constrói
em sua “prisão” versos verdadeiramente bonitos. A relação é expressa
cuidadosamente, em uma lenta comunhão que muitas vezes se extravai para além da
percepção conceitual. É um tipo de música que trabalha intensamente com
conceitos, mas está primariamente fundada no que essa imersão extracorporal
realiza com nossas percepções. Até a “entrada” na parte mais sinistra do disco,
que se inicia na segunda faixa, é uma transição de modo que o último período da
música se estenda para outra- estamos claramente falando de prolongamentos.
Os eletrônicos densos e
meditativos de Michel são perfurados quando combinados para a viola, mas não
que um tenha necessariamente função oposta ao outro. Muitas vezes a viola cria
o ambiente também enquanto a parte de Michel soa alto, revelando influências do
dito dark ambient e do noise. De alguma maneira, é como se toda
a potência de ambos os espectros tentasse ocupar o espaço do outro, não em
forma de disputa, mas uma compreensão de possibilidades e o que tais atritos
podem efetivamente criar. É certamente algo que soa além da simples soma entre
sons mais “clássicos” dessas diferentes abordagens. Provavelmente releva um
espaço novo sempre que tal atrito é criado, e por desconhecermos (e só estarmos
dispostos a compreender o que nos viciou), foge de nossa apreensão.
Banabila disse recentemente que essa é apenas uma evolução natural
de sua música, mas é engraçado como um músico de seu gabarito, que desde 1986
vem produzindo um corpo sonoro muito importante para a música eletroacústica,
considera “evolução natural”. Obviamente mais minimalista que suas outras obras
e menos seletivo (nesse álbum, por exemplo, não há inserção de nem um sample), também abdicou de uma espécie
de multi etnicismo para algo que se aproxima às relações de causa-consequência.
Esse minimalismo focal, porém,
cede muitas vezes espaços para construções cinematográficas. A última faixa
lembra muito ambientes interioranos, e Oene
nos apreende com violino e viola, onde as cordas variam entre o livre improviso
e música clássica contemporânea. Essa música é exemplo da dualidade e confiança
da dupla- nela, ambos os espectros realizam o livre improviso e uma construção
mais metódica. Não consigo capturar o conceito de Music for Viola and Electronics II, talvez pelo que mencionei no
primeiro parágrafo; a dificuldade em reconhecer novos territórios quando uma
arte de vanguarda aponta elementos tão limítrofes. Curiosamente, quando os
músicos convidados são introduzidos, que toda essa elaboração fica mais
assimilável.
Passando por toda a obra Banabila (onde Spherics talvez seja a
mudança completa de rumo) temos contrariedades inerentes à visão complexa que
um artista tem da música. Onde as expectativas possíveis se equivocam a cada
lançamento. Mas repito, é um corpo sonoro poderoso. Eu indicaria Spherics como o melhor ponto de
inserção, porque os direcionamentos de seus discos nos deixa sempre a sensação
de algo realmente “grande”. Onde meros “formatos” são dissolvidos em prol de um
caráter mais honesto em um lugar que as sensações ficam em primeiro plano. Ou
seja, um compromisso radical com sua visão de vida, que indubitavelmente está
em cada segundo de suas músicas.
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