As pessoas prometem, as pessoas
tentam, as pessoas erram. Muito. Lê Almeida tem seus atos como pontos de
partida para suas narrações, insistindo com o autoproclamado “roque de guitarra”.
Tentativas; acertos e erros. Paraleloplasmos
é um disco de tentativas também, embora sua estética se situe em algum terreno
que fãs do Slanted and Enchanted
certamente se reconheceriam. E, com certeza, iam sorrir ao ouvir uma música
como Fuck The New School.
A voz intencionalmente baixa
proclama verbos soltos. Parece que ela está destruída, mas assim, de alguma
forma, precisa relatar algo. Parece que o coração do músico tenta ganhar
sobrevida nesses cantos, na repetição dos riffs,
nos efeitos. Eu já ouvi muita coisa do Lê, mas nunca tinha sentido uma relação
urgente com a “sobrevivência após a destruição” que esse disco parece tratar.
Pensamentos de dias mais dolorosos que tornam o presente mais árduo. É
difícil sair dessa situação e “virar o jogo”. É muito árduo se levantar.
Trata-se de reconhecimento,
também. São feridas nas quais podemos nos ver. Podemos pensar, “sim, tudo isso
é uma desgraça, é tudo muito difícil”. Percebemos-nos no meio de um caos íntimo
e com pensamentos que apropriam nossos recônditos; “por que daquele jeito? Por
que eu fiz aquilo”. As linhas melódicas da guitarra, no entanto, tornam esse
processo mais aceitável. Há a destruição, mas houve vitória. Mas o artista tem
que se expressar. Ele tem que questionar os motivos e, se estes o atormentam,
ele deve expor essa angústia. Lê está desestabilizado e ele não quer esconder
isso. Toda música soa meio “à beira de uma queda”. Mas Almeida já sobreviveu às
outras quedas. Ele vai escapar dessa.
É divertida a relação entre “voz
x guitarra”. Ao tempo em que a voz de Lê é propositalmente monótona durante o
disco, todas as variações são deixadas para a guitarra. É como se Almeida se expressasse
com o corpo inteiro e os pontos que as letras não conseguem exprimir são
deixados para a guitarra. Este instrumento é uma espécie de porto seguro que
impede o “eu lírico” de cair diversas vezes durante o álbum. Talvez mais; seja
a força que apresenta uma paisagem mais agradável para que o músico possa olhar
pra frente, pois outros dias aguardam e neles mais histórias, mais músicas vão
ser compostas, mais pessoas por quem se apaixonar.
Instrumentalmente, há mais
variação que nos outros trabalhos. Embora o foco continue sendo a guitarra,
esses outros instrumentos se “intromentem” criando uma ambientação sem a qual o
disco soaria demasiadamente frágil. Embora “fragilidade” é um qualitativo que o
álbum mereça. Ora, ele expõe uma instabilidade evidente desde a primeira
canção, “eu tenho pensado / como é ruim sair só / eu tenho tentado / me adaptar
a andar só”. Outra relação divertida; as letras que analisam por demais a
intimidade do cantor e o instrumental que mira paisagens mais “externas”.
Eu hesitei em falar desse disco
em uma esfera só, e apenas só, pessoal porque soaria demasiado piegas. Mas
deixo a pieguice para o último parágrafo. Espero, de verdade, que as pessoas se
reconheçam nesse álbum. Que elas virem amigas do artista dissipado que reside
nesse disco. Precisamos de companheiros de travessia; qualquer forma, ser viva
ou inanimada, que nos ajude. Porque, como em Paraleloplasmos, viver é um exercício de retornos frustrantes,
partidas tristes- passar por um local sozinho em que você costumava ir com
determinada pessoa. De repente, a ausência se torna pesadíssima. De repente,
você se grudou tanto a outro que não reconhece sua carne, suas feridas, as
marcas na sua pele. Eis o motivo de precisarmos de ajuda.
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