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segunda-feira, 18 de maio de 2015

Lil Ugly Mane - Third Side of Tape [2015]

Lil surpreendeu todos com esse lançamento. Se alguém visita o soundcloud do artista, pode perceber que lá anuncia que o projeto “Lil Ugly Mane” está morto. Quem está habituado a seu trabalho, vai encontrar aqui os mesmos elementos dos outros lançamentos- as influências pós-industriais com o instrumental do rap, além de adesões mais sinistras e referências complexas que destoam do primeiro plano (isso quando há um primeiro plano). O abstracionismo do primeiro lado já é notável. As transições são bruscas, os samples dos rappers predominam sobre bases abstratas, quase sempre se dissolvendo em outros efeitos completamente inesperados. Embora essa espécie de estranheza é esperada para quem conhece seu trabalho, a proposta aqui é diferente de outros álbuns que o deixaram aclamado no meio underground.

Third Side of Tape trabalha como uma retrospectiva dos trabalhos antecessores de Lil. Desde os lançamentos mais crus a outras produções mais elaboradas, sua obra reside exatamente “entre” as transições de diversos gêneros para uma construção concisa dessa mistura. Pode-se sentir que a modulação eletrônica de Lil diversifica uma base de samples gigantesca. Mas não quero tratar de que a simples “curadoria” de Mane se garante sozinha. É justamente as distorções desses elementos e seus diversos pontos de encaixe, muitas vezes abruptos, que localiza uma progressão entre as suas primeiras obras e Third Side of Tape, que é uma retrospectiva poderosa de sua carreira, uma vez que a “montagem” das faixas obviamente não segue cronologia alguma. O acionamento do “horror” a proporções absurdas, gerando resultados surpreendentemente uniformes, mantém uma atmosfera obscura estabelecida pela disseminação de transições, como se essas mudanças evidenciassem o desconforto e a urgência de Lil. Suas influências também acondicionam uma espécie de “universalidade” que simplesmente acontece. Não temos um artista tentando desesperadamente se acondicionar no que preguiçosos acostumaram chamar de “world music”, mas sim estados de incômodo em que uma transmutação se faz necessária. Fica complicado descrever o álbum, é necessário já estar exposto a alguns de seus discos antecessores, uma vez que a “investigação” nos trabalhos de Mane torna, asseguradoramente, esse percurso de duas horas muito mais palpável.

As colagens, sem dúvida, são os pontos mais altos do disco. Incrível como elas são introduzidas como uma continuação lógica interna do que Lil queria significar em cada música. Seja nos raps mais acelerados e falados, ou num Techno que vai evadir em jazz. É como uma jornada em que o reconhecimento de cada diversidade sonora é apresentado como uma memória, e estas insurgem com uma força própria, desmerecendo qualquer medida temporal. No desenvolvimento do disco, há uma tentativa de aproximar distintos significantes, isso amplia a estética, dando poder também ao público e espaço para que este forneça suas próprias experiências. Não se trata daquele mero espelho de “se reconhecer nas canções”, mas sim da origem cognitiva de cada pessoa. As influências de música “disco” dos anos 80, por exemplo, certamente irá influenciar cada ouvinte à sua maneira. No entanto, ela tem uma importância no próprio discurso. Ou seja, nada é tão abstrato em Third Side of Tape, mas ele deixa várias lacunas que necessitam de pessoas dispostas à preenchê-lo. Com potencial para um “nicho” tão grande, Lil não se permite forjamentos artísticos com apenas colagens sonoras. Pode-se ver que é sim um artista “insano”, mas que sua obra discursa sobre estar incomodado; com o óbvio, com o ambiente que nos cerca. Third Side of Tape é a expansão branda que não estava presente nos lançamentos anteriores. O experimentalismo foge do que antes era “só” hip-hop para um acervo completo de um mundo de imagens elípticas. Incrível como Lil guardou tanto material ao longo dos anos, períodos em que seus lançamentos evidentemente seguiam uma “proposta” mais reservada.


A combinação esparsa desse disco, curiosamente, destoa com as seis faixas anunciadas. Alguém não informado sobre a quantidade de música certamente chutaria muito mais. Mas com Lil nada é “óbvio”, e as diversas naturezas de Third Side of Tape certamente anunciam mais que um artista incomodado com a produção da música contemporânea. Elas revelam um homem trabalhando muito para construir uma assinatura autêntica. Não se trata, portanto, de localização temporal e exibicionismo de conhecimento. Para Lil, o tempo é outra invenção e todas as invenções tem uma origem em comum- a capacidade humana de distorções a realidade em forma de música. É como estar em um túnel onde nunca se esteve antes, e as únicas armas que temos para enfrentar essa incerteza são nossas próprias experiências e nossas memórias. O caminho já está perdido de qualquer forma. Third Side of Tape é o melhor trabalho de Lil porque além do todos os elementos anteriores que já deixavam sua música muito atrativa, evidenciam que Mane tem um legado muito poderoso, que vai lentamente se concretizando em cada lançamento.

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