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quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Versos de Pessoa: O espanto como matéria prima (ante) literária.



Despersonalizado, heteronímico, Fernando pessoa confabulou versos fragmentados nas possibilidades múltiplas da mente humana, ao mesmo tempo em que apontava o Nada (na concepção de Heidegger). Heterônimos esses que desenvolveram do- que a psicanálise aponta como- inconsciente o mais alto nível de linguagem canônica pessoana. Um homem abriga várias vozes, parece ser o legado maior do escritor, sofisticando versos simples com um notável fluxo de espanto carregado onde o eu lírico é explicitado, a metafísica indagada como a ciência positiva. Literariamente, o fascino que Pessoa exerce é um chamado para passagens mais marcantes que a literatura pode oferecer; estendendo as mãos para o além do instituído literariamente (não à toa ele desdenha de Dostoiévski), ler Pessoa é redescobrir recônditos pessoais que a sociedade do mascaramento insistiu em esconder.

A obra de Fernando poderia ser vista com a intenção da totalidade aplicada na poesia, não fosse uma angústia solitária constantemente presente. Sua língua pode ser simples e reduzida, o que não deixa a literatura pessoana menos intrincada, os enigmas se convergem para a adoração do ser em última instância em termos heideggerianos. Precisando minuciosamente os versos, os temas para Pessoa sempre são retratados sob a retaguarda do espanto e da construção da literatura mais profunda, da forma esteticamente mais disposta; métrica, versos livres, prosa poética. Múltiplas formas, porém, não devem, nem de longe, ser o que predomina em uma análise ante racional de seus poemas; deve-se atravessá-los, pois falam de lugares ausentes.

Apesar de ter criado condições biográficas formidáveis e brandamente inventivas para seus heterônimos, a marca pessoana circunda todos os poemas. Sejam as Odes de Ricardo Reis, o impulso de Álvaro de Campos, ou o naturalismo estoico de Caiero. Vivendo isoladamente  em Portugal, Pessoa, que confessava só viver através da literatura, empenhado em criar uma vasta e dispersa obra literária (até dizia em algumas cartas que um dia tomaria coragem e começaria a reunir seus inúmeros escritos), tornou-se o próprio símbolo da poesia impossível, pois desejando ser tudo ao todo tempo, descreveu a “estalagem onde tem que se demorar até que chegue a diligência do abismo” e tão somente isto.

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