“A memória já não pode ser inocente, o passado se tornou amargo”,
Alejandro Zambra.
Esperar algo lógico das
composições do Berne já se mostrou estupidez- maneira de dizer, talvez, porque
já esperamos dele inesperados arranjos e circulações tortas, que por vezes
emprestam um tema e brincam dentro deste, ou descarregam para o livre improviso
na melhor tradição europeia. Uma aventura extremamente única cada vez que piano
e saxofone interagem, seguramente despontando para diversas possibilidades de
aterrissagem, porque de algum modo quando entramos em Shadow Man, já alçamos voo, embora não percebemos.
O vibrafone de Ches Smith constrói
uma atmosfera lúdica. As melodias crescentes se cruzam, para o saxofone de
Berne abrir um dialogo catártico com as notas dispersas do piano. Não é exagero
comparar a liberdade do saxofone com uma tela sendo pintada pela pura
inspiração, contendo passagens mais concentrado-intimistas em que a razão dita às
notas, assim como liberdade total para momentos de pura intensidade! Elementos tão
bonitos e delicados que ganham corpo até formar uma disfunção enquanto música
lógica. Para se perder, nos sussurros do saxofone, nas aceleradas do piano, na
bateria que por vez ou outra resolve chamar a atenção, ou no clarinete de Oscar
Noriega que cria um atrito decididamente bucólico entre todos os instrumentos.
A discografia de Berne ganha outra grande obra, dessa vez, um pouco mais
impecável que as outras.
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