Impressiona muito a coerência dos
últimos lançamentos de Donoso no decorrer dos últimos anos; é sempre essa áurea
essa celeste, como se outros seres (trajados às vezes como espíritos ou
entidades) fossem invadir nossos corpos. Sua obra é repleta de trabalhos
atmosféricos arquitetadamente construídos sob a influência da utilização de
sintetizadores.
Machine to Machine é realmente
aquele típico trabalho que é melhor ouvir sozinho, com os fones de ouvido,
imaginando cenários possíveis para a grandiloquência que é o clímax da primeira
peça. O álbum, inicialmente, se revela como algo que vai conter muitas
insinuações e detalhes que só podem ser percebidos depois de algumas ouvidas. O
problema é que os “defeitos” nunca vão ser concretizados enquanto potência e
vão permanecer no plano do interminável. A música de Donoso é muito pautada em
riscos, mas aqui eles não soam perigosos; parecem efeitos que existem por uma
aleatoriedade estética que Donoso raramente mostrou em sua carreira.
Infelizmente, essa falta de força e fibra está em todo Machine to Machine.
Não é um disco coesivo como
Saravá Exu em que a unidade da progressão sonora convivia com a repetição sem
corromper nenhum propósito de Donoso. E não é nem que algo soe “corrompido” em Machine
to Machine, é que não há ponto de ligação entre os microssistemas que o formam.
Não é um processo de derretimento como o antecessor e pra falar a verdade, eu
tenho alguma dificuldade para saber sobre o que se trata exatamente. Há, no
entanto, em alguns momentos, uma pluralidade de sons que aponta redenções para
o disco (elas só podiam acontecer mais). Aliás, é essa pluralidade que pode
rasgar a faceta mais “frágil” da música de Donoso e aproveita melhor seu
potencial.
Não é no conceito que Machine to
Machine se equivoca, mas sim na falta de um cerne que realmente represente toda
a história intencionada. Há intenção, mas não há evidências dessa intenção. Não
há cortes, não há interrupção. Ao mesmo tempo, nada parece intencionalmente
contínuo. Parecem sons aleatórios. Os movimentos não soam vivos (e não é
realmente como se a morbidez fosse a intenção). Sabemos a vocação de Donoso
para a retaliação, para a estruturação cuidadosa de ambientes que depois são
esmagados.
Sei que soa um pouco impreciso
simplesmente falar que não há naturalidade na movimentação de Machine to
Machine, mas realmente me parece um apanhado de sons que normalmente (pela
facilidade de Donoso) transitariam em unidade sem problemas. As máquinas de Machine
to Machine existem por existir; elas não constroem nada, elas não retaliam nada
e elas não ameaçam nada. A música não se mostra soberana; é evidente que tem
alguém manipulando e que estamos sendo manipulados.
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