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quinta-feira, 9 de abril de 2015

Odradek - Homúnculo Vol. 3 [2015]

O conceito de homúnculo talvez seja muito hermético, mas basta lembrar-se daquelas criaturas extremamente desproporcionais, cujas deformidades chamam a atenção, principalmente em um mundo onde a aparência anda tão alinhada e restringida. Talvez essas imagens nos orientem através dos três volumes de EP’s lançados pelo Odradek. Tive a oportunidade de ver uma apresentação desses caros, ano passado em Araçoiaba da Serra, e fiquei de boca aberta. Lá eles já davam a cara com a variação rítmica, sensibilidade autêntica e diversidade de timbres. As referências aqui também apontam algo; é impressionante como em apenas três canções fica a sensação de que não há repetição, entre as melodias vocais contradizendo com o instrumental feroz, a progressão sonora estimula novas formulações cada vez que há uma troca de tempo, por exemplo. Talvez esses surgimentos inesperados justifiquem o título.

O contraste entre o instrumental evidentemente progressivo e os vocais melódicos, as letras inteligentes ( I accept the challenge/ Little did I know/ That satan flirts with shaved legs/ High heels, painted nails and nasty offers) e a interação entre os instrumentos mantém uma dinâmica que não se desgasta. Ao contrário, cada momento é valioso em Homúnculo Vol. 3 e direciona conexões improváveis que ao se estabelecer desafiam noções “comuns” de música. Ao decorrer das faixas, percebemos que eles não se assentam nas mesmas engrenagens e que cada canção surge como um surto para surpreender o ouvinte. A bussola do Odradek não tem vergonha nenhuma de mudar abruptamente, - norte ou sul, a mudança de caminho é como se fosse a única “pré-exigência” da banda. Eu pensei, na primeira escutada, que as faixas, apesar de boas, soavam incompletas. Depois de algumas outras, fica claro que a mutabilidade de cada canção torna o processo de ouvir o disco repetidamente obrigatório- pelo menos se você desejar aproveitá-lo em seu máximo; os grooves surpreendentes, as viradas na bateria.

A diversidade é realmente o ponto forte do Odradek, e mais do que isso, como as transformações sônicas do disco se passam de modo que não invalidam a construção anterior e ainda assim tira o ouvinte de sua zona de conforto. Pense bem, essa dinâmica de mudanças constantes pode muito bem dar errado e soar ruim se não há uma vontade coletiva dos membros da banda.

Parte também da alquimia é a troca entre o idioma das letras, de inglês a português. Esses eventos que preenchem o universo de Homúnculo não servem apenas para mera contemplação dos ouvintes, mas muitas vezes essas inversões forçam uma ruptura entre o “esperado” e o que “surge”. A banda claramente está “dando forma” a um produto que parece muito longe do seu fim. Tenho a impressão de que, embora obviamente muito ensaiado, esse EP não surgiu de contornos pré-estabelecidos, mas sua modulação foi se transformando e ganhando corpo a muito custo, muitas ideias desperdiçadas e outras tanto aproveitadas.


O Odradek tem a moral de não “repetir” mesmos seus instantes áureos porque sabe que a construção que eles optaram é sempre de uma novidade surpreendente. Homúnculo traz acima de tudo uma tensão e tudo que pode envolver ambientes tensos- a guitarra fritando, o cinismo de alguma das letras, as jams que progridem e transmutam de forma implacável, as viradas loucas da bateria. Tocando o que esses rapazes tocam, eles podiam cair no limbo do mero “exibicionismo”, mas a construção desse EP implica em um não ostracismo evidente. Falei da tensão, mas a tensão de Homúnculo é aquele de que “sempre algo vai acontecer” e isso devido ao mérito da banda adicionar mudanças constantes em uma dinâmica estrutural que surge sempre algo “novo”. Novidade que nem sempre é tão aceita num mundo que todos ouvem “apenas o que gostam”, mas é um desafio que merece ser encarado.

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