Não há dúvida que a trilogia
lançada em meados da década de 90 pelo Maschinenzimmer 412 foi essencial para
estabelecer o pós industrial- explorando um território limítrofe entre Black metal, industrial, poewr eletronics e dark ambient.
Criando obras extremamente perturbadoras, pode-se afirmar sem engano que o Mz. 412 é responsável pelos lançamentos
mais extremos da música nesse mais de vinte e cinco anos. In Nomine Dei Nostri Satanas Luciferi Excelsi [1995] com loops
obscuros e pesados, samples distantes
e instrumental ao vivo, atmosfera ritualística e pequenas passagens mais calmas
e serenas, tudo isso em pouco mais de uma hora. Burning the Temple of God [1996] tem aquela capa clássica da igreja
pegando fogo, e é um ritual que relembra velhos clássicos da música industrial,
em conjunto com um Black metal cru, e um dos primeiros registros entre o Black
metal e o noise. Nordik Battle Signs [1999] fecha a trilogia com formas puras e
extremas de expressão, profundamente inspiradora (a seu modo, convenhamos) e
envolvente. O legado deixado pelo Mz.412
se dissolve em timbres perversos, onde a interação entre elementos extremos
idealizam ambientes ocultos de forma extremamente sensorial.
No último dois de março, o MZ 412
lançou pelo selo inglês Cold Spring a
gravação de uma desempenho ritualístico executado há quatro anos, na lendária The Garage, em Londres. A apresentação
ao vivo marcou a reinterpretação do vasto material acumulado nos últimos vinte
e três anos. É quatorze faixas, que são indicadas como atos e seguidas de
algarismos romanos. Essa repaginação, mais do que uma forma de atualizar a
visão musical, se apresenta como um embrutecimento daquelas faixas. Ou seja, é
como se elas tivessem, de certa forma, mais “pobres”.
A claustrofobia ganha maior
aderência, maior tato. É como se todos esses anos de produção, toda essa
desolação somada, a angústia, a perversão e o caos fossem nos enfiado goela
abaixo, sem dó. Imaginem todas as almas que rastejaram e elas agora nos
fechando em um quarto escuro, sufocado pelo desespero. É um tipo de música que
essencialmente ofende o estomago, onde as diferentes camadas sonoras (difícil identificar
qual é a mais agressiva) abrasam ironicamente essas pseudo fortalezas em
terrenos áridos, distantes, muito, muito cruéis. Como se apertar o play fosse
abrir a caixa de pandora, mas em um local onde não há ninguém que possa
compartilhar essa experiência, você está muito sozinho e apenas esses gritos de
fantasmas distantes te acompanham. Penso nesses ruídos e relaciono com
dizimação em massa, tropas marchando, soldados decepados, nos estupros
cometidos, na maldade e na dor. É uma verdadeira carnificina sem escapatória,
onde ninguém sobreviverá. Sem dúvidas, ninguém consegue ficar indiferente a
esse tipo de catarse sonora.
São mimetizadas marchas militares
com poderosos e implacáveis fluxos sonoros, onde a dizimação coletiva simula
batalhas doentias onde ninguém escapa. Metais se distendendo e perfurando
qualquer coisa que ouse passar na sua frente, ou atmosferas mais “calmas”, como
se procurasse algum conforto existencial nessas manifestações malignas e só
descobrisse um vazio, evocando experiências extras corpóreas, vozes demoníacas,
gravações de chamadas a partir de rituais esotéricos exibidas em flashs durante a apresentação, combinado
com gritos perfurados que originam mil manifestações eletrônicas. São episódios
hipnóticos onde podemos ver uma maré negra que sobe gradualmente ao som de
tambores de guerra e um relâmpago silencia toda essa miséria humana. Pode-se,
por outra ótica, ver isso como um rito, uma passagem que libera em algo,
digamos, mais essencial. Mas é um atravessamento extremamente duro,
desconfortável e duvido, de verdade, que muitos aguentem presenciar uma
apresentação dessas até o final.
Um trabalho como Hekatomb denuncia também uma
movimentação poderosa de “música subterrânea”, nesse caso em particular, ligada
ao pós-industrial sueco. Como se representasse o pior na descida dolorosa de
Dante ao inferno, onde decididamente não há caminho verdadeiro, em uma selva
tenebrosa, numa sinistra floresta onde nos deparamos com tristeza, solidão e
desânimo. Lembro-me da movimentação interessante que ocorre no Brasil de
deslocamentos parecidos e acho muito importante que as pessoas tomem nota desse
registro. Registro de um local extremo e claustrofóbico, que existe com uma
força derradeira.
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