Eu já descrevi aqui como fiquei empolgado pelo EP lançado ano passado pelo "E a terra nunca me pareceu tão distante". Bem, imaginem o show dos caras, que é sem dúvidas mais intenso e explosivo e sem dúvidas, muito, muito alto.
É uma das bandas de SP que mais dá gosto acompanhar. Sempre barato os rolês, dá pra tomar uma cerveja gelada, conversar com as pessoas. Enfim, o Lucas Theodoro, que é guitarrista da banda (também formada pelo Marcelo Terreiro no baixo, Luden Viana na guitarra e Rafael Jonke Buriti na bateria), topou responder algumas perguntas. Ele fala sobre uma série de fatores, sobre como é criar música, a "cena", suas bandas favoritas, etc:
-
[A.A] Você cresceu ouvindo que
tipo de música? Como foi acabar no post-rock?
[Lucas] Acho que esse tipo de “crescer” é bem relativo,
meio que vem em fases. Lembro de ouvir sertanejo de raiz com meu pai quando era
pequeno (Almir Sater, Renato Teixera e afins).
Daí veio o Nirvana na minha vida, que foi quando comecei
a tocar violão e guitarra. Logo depois disso o Punk e Hardcore mudaram a
concepção que eu tinha de música e de mundo.
O Post-rock chegou lá por 2005, na fase que aprendi a me
abrir pra qualquer tipo de musica. Era quando ouvia desde um disco da Adriana
Calcanhoto que achei na casa dos meus pais até umas bandas desconhecidas de
gritaria que achava pelo Orkut haha.
No meio de tudo isso me interessei muito pela geração de
bandas emo dos anos 90 (mineral, penfold, cap’n jazz, american football, texas
is the reason, etc...). Daí nessa época
já comecei a ouvir bandas como explosions in the sky e mogwai, que me davam o
mesmo tipo de emoção e intensidade dessas bandas dos anos 90 , mas sem usar uma
palavra cantada. Isso me impressionou muito.
Mas tem dois discos que me fizeram sonhar em um dia ter
uma banda que fosse parecida com aquilo: Easily
Misunderstood do Samuel Jackson Five e o Split do At The Drive-in com o The
Aasee Lake.
“The Aasee Lake” é uma banda de Louisville, Kentucky que
nunca chegou a lançar um disco fora esse split, mas que com certeza me mudou.
Alguém colocou no myspace as demos do disco “Amazing Stories” que eles iriam
lançar algum dia. Acho que é o Post-Rock sem delay mais incrível que já existiu
haha.
[A.A] Como a experiência de ter
tocado em outras bandas influência na dinâmica do EATNMPTD?
[L] Eu toco com o Marcelo na “Doppelgangers!”(dpplgngrs.bandcamp.com) faz 7 anos já.
O Luden toca com o Rafa em bandas desde sempre também, talvez há uns 10 anos.
Isso é muito bom por que quanto mais tempo passa você acaba ficando mais focado
no tipo de coisa que vale a pena fazer como banda ou não.
No caso meu e do Mama, como sempre estivemos envolvidos
mais em uma cena de punk, hardcore e afins, o do-it-yourself acaba sendo uma
coisa muito intrínseca. Marcar os próprios shows, fazer as próprias camisetas,
gravar os próprios CDs em casa e dobrar a capinha com a arte para embalar...
Enfim, acho que simplesmente não sabemos fazer de outro jeito.
Isso com certeza influenciou na visão que temos com a
EATNMPTD.
O Rafa e o Luden compartilham bastante dessas idéias
também. Sempre procuramos fazer as coisas do jeito mais acessível possível.
Seja vendendo nosso ep e camisetas a um preço honesto, disponibilizando nossas
músicas de graça para download ou até mesmo negociando horários e preços de
show com quem marca um show nosso.
Não queremos privar as pessoas de ver um show nosso
porque a entrada custa mais de 10 reais ou simplesmente porquê o horário não
permite voltar de transporte público. Isso é o tipo de coisa que nós realmente
nos importamos.
[A.A] Como ocorrem as composições das músicas?
[L] É difícil de dizer porquê varia muito, mas posso dar
exemplos:
O Luden tinha 2 dos temas que estão no EP bem definidos
desde que começamos a tocar. Daí começamos a estruturá-los como música a partir
de jams em ensaios.
Uma noite dessas lembro de ouvir a demo de “Essa deveria
ter seu nome...” que ele gravou sozinho com guitarra em casa para nos mostrar.
Foi engraçado ouvir essa demo tanto tempo depois, porque na concepção ela já
era basicamente 80% do que a musica é hoje.
O tema de “Pequenas expectativas, menores decepções” é um
riff que carrego comigo desde 2005, mas a construímos tocando juntos.
Enfim, a gente sempre acaba escrevendo em casa algumas
coisas e tentando estruturar gravando demos e tudo mais. Mas as músicas só
ganham força e ficam vivas mesmo quando as tocamos os 4 juntos nos ensaios.
Algumas acabam saindo inesperadamente fáceis, outras são mais difíceis.
Por exemplo: tem uma música que tocamos em shows desde o
ano passado e que cada vez sai de um jeito, e uma outra que tem poucos meses
mas que já se estruturou praticamente desde a primeira vez que a tocamos.
[A.A] Talvez não seja o melhor
dos cenários, mas muitas pessoas de outros estados reconhecem que há um suporte
maior para música independente em São Paulo. Você concorda com isso e como você
sente a cena paulista?
[L] É difícil comparar porquê não vivi a cena de muitos
lugares no Brasil. Mas o que eu vi que rola em cidades próximas como Campinas e
Sorocaba são lugares que as pessoas vão independente de quem estiver tocando. E
não só vão pelo rolê, como assistem as bandas e compram CDs e camisetas. Enfim,
saem de casa pra assistir uma banda que nunca ouviram falar. Aqui em São Paulo
vejo muito pouco esse tipo de público que sai de casa pra ver algo que não seja
uma banda que já conhece ou a banda de um amigo/amiga. Acho que com exceção de
shows de SESCs e CCSPs da vida.
Mas não dá pra jogar essa culpa no público quando são
poucos os lugares que te dão estrutura também. Seja de organização,
equipamentos ou até mesmo honestidade com as bandas.
É um cenário complexo. Talvez São Paulo seja um lugar de
maior visibilidade e de público em potencial, mas não é fácil.
[A.A] Em termos de
expressividade, quais são os benefícios e desafios de se ter uma banda
instrumental?
[L] Acho que acabamos nos preocupando mais com a duração
e repetição de compassos e temas. Por mais que às vezes seja legal tocar no
improviso variações da mesma coisa, a gente fica constantemente lapidando as
músicas pra que elas tenham o melhor tempo onde consigam construir e
desconstruir uma narrativa e lógica interna.
Quando tocamos com o All People e com a Lisabi mês
passado em São Paulo eu tentei falar no show sobre o quão maluco é saber que no
último ano nós conhecemos várias pessoas incríveis e nossa musica chegou muito
mais longe do que esperávamos, sendo que o máximo de palavras que usamos são os
títulos das musicas. A gente vive uma experiência muito única nos shows e é
realmente incrível ver as pessoas suspendendo um pouco a vida durante aqueles
minutos de musicas.
Uma vez um cara em Campinas disse pra nós depois do show
“obrigado por fazer do mundo um lugar menos horrível enquanto vocês tocam”.
Acho que foi uma das coisas mais impactantes que alguém já me disse na vida.
É muito surreal conseguir tocar as pessoas desse jeito
sem ter um refrão que elas possam cantar junto, saca?
[A.A] Embora post-rock, é
perceptível a composição das músicas variando entre alguns outros estilos. Como
balancear essas diversas influências?
[L] Acabou se tornando bem natural pra nós, na verdade.
Acho que “post-rock” é um termo mais fácil para as pessoas assimilarem o som e
entender o que podem esperar de nós antes de ouvir as musicas. Mas é
provavelmente o tipo de musica que menos ouvimos em nosso dia-a-dia.
Aí acabamos nem pensando muito nisso da hora de tocar.
Nunca deixamos de tocar algo de um certo jeito por não ser “pós rock o
suficiente”, sabe? hahaha
[A.A] Como você se sente sobre a diferença
entre gravar em estúdio e tocar ao vivo?
[L] Ao vivo eu sempre me machuco muito mais hahaha.
Na real, nosso disco foi gravado com nós tocando ao vivo.
Poucas coisas foram adicionadas depois ou gravadas por cima.
Nosso querido amigo Norton Bell (que gravou e mixou o ep)
conseguiu armar uma estrutura pra que cada amplificador e a bateria ficassem em
salas diferentes. Também gravamos sem metrônomo para que as musicas tivessem
seu próprio respiro e abertura para eventuais “falhas”. Acho que tudo isso nos
ajudou no processo de tentar deixar mais humana a experiência de gravar/ouvir o
disco.
Mas a experiência do show é muito mais legal pra todo
mundo. Pra quem assiste tem um impacto muito maior, e pra nós é emocionalmente
muito mais forte.
[A.A] Nessa loucura de ter
praticamente todo quanto tipo de música disponível, enquanto ouvinte, como você
“separa” o que vai ouvir?
[L] Acho que acabo fazendo de 3 jeitos.
-Um é na loucura de ouvir no computador em casa enquanto
faço outras coisas. Daí isso é aberto a qualquer coisa desde vídeos
relacionados de youtube, bandcamp de bandas e gravadoras, shuffle all da
biblioteca do iTunes... Enfim, é o jeito que ouço o maior volume de coisas e
acho isso maravilhoso. Esse é o jeito menos peneirado de fazer a coisa, mas
mais aberto também. O ruim é que na maioria das vezes é meio disperso enquanto
faço outras coisas.
-Na rua com fone de ouvido é uma coisa que sempre fiz.
Relacionar certos lugares e momentos de vida com certos discos é inevitável.
Acho essa relação de musica e cidade algo incrível.
-Mas pra ouvir com atenção é no vinil, não tem jeito.
Confesso que muitas vezes já me atrasei porquê simplesmente não dá pra sair de
casa enquanto o lado do disco não termina haha.
Ultimamente tenho feito a mesma coisa com CDs. É algo que
meio que te força a ouvir o álbum todo na ordem até o final. Faz bem.
[A.A] Quais músicos mais te
influenciam na maneira de criar música e conduzir o instrumento?
[L] Guy Picciotto
(Fugazi e Rites of Spring) e Jim Ward (At The Drive-in e Sparta).
Acho que Fugazi de uma forma geral é o que me inspira a
manter as coisas simples na guitarra, sou meio da política de colocar a nota
certa na hora certa ao invés de complicar tudo fazendo mil coisas e arranjos.
E o At The Drive-in é a intensidade de tocar musica ao
vivo com coração. Claro que isso te faz errar, sangrar, se machucar e suar
muito mais. Mas , de verdade, acho que não consigo fazer de outro jeito.
[A.A] Quais os próximos planos da
banda?
[L] Gravar nossopróximo EP. Provavelmente em Setembro.
Enquanto isso, queremos tocar no máximo de lugares pelo
Brasil.
[A.A] A capa do álbum é muito legal.
Como rolou?
[L] Valeu! Passei o ano novo de 2012/2013 na praia. Daí
no primeiro dia do ano tirei essa foto com o celular mesmo. Tinha um valor
muito pessoal pra mim, por ser uma fase meio ruim que tava começando a passar.
Mas, quando virou a capa, se transformou totalmente.
Toda a parte gráfica do disco é do nosso querido amigo (e
quase irmão pra mim) Vitor Fiacadori.
[A.A] Vocês têm bloqueios criativos?
[L] Temos ensaios ruins as vezes. Mas sempre acaba
ajudando a motivar.
É bom lembrar que nem sempre as coisas serão boas e que isso é normal.
É bom lembrar que nem sempre as coisas serão boas e que isso é normal.
[A.A] Quais outras artes
influenciam sua música?
[L] Tudo influencia nossa música. Os filmes, os livros,
os quadros, a cidade, nossas casas, nossas famílias, amigos, relacionamentos...
Acho que não só influenciam, como muitas vezes são justamente os motivos pelo
qual nós fazemos musica.
[A.A] Valeu! Se quiser, deixa ai
um recado pra quem leu.
[L] Ah, acho legal reforçar que todas as respostas são bem
pessoais minhas e que possivelmente cada um da banda responderia algumas
perguntas de jeitos diferentes.
Tocar essas musicas tem feito um bem danado nas nossas
vidas e a resposta que as pessoas tem dado em relação ao nós é ainda mais incrível.
Esperamos tocar
muito mais. E acho que é isso haha.
Valeu Henrique pela grande força nos dando esse espaço
pra falar um pouco sobre a banda.
Brigadão (:
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