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segunda-feira, 2 de março de 2015

Theoria - Vamos Desistir do Brasil [2015]

Há algo de impressionante no aumento da quantidade de música eletrônica criada no Brasil nos últimos anos. Desde sonoridades que remetem mais a uma tentativa de desconstruir um indivíduo forjado às variações opressivas de ambientes enclausurados. Consequências musicais do tão chamado “pós-industrial”, enfatizando atmosferas sombrias em dissonâncias sônicas. Porém, os artistas que têm optado por essa veia estética não tem se condicionado à unicamente um ângulo nesses estilos eletrônicos mais densos. É estranho falar sobre como essa música realizada com tanta racionalidade faz surgir uma espécie de “asco” dentro da gente. Expurgatório sonoro.

Theoria diferencia-se no tocante à ironia, desde o nome do disco, ao nome das letras e a capa. Comicidade que é um contraponto às músicas ruidosas. Temos o “clássico” ambiente mais introspectivo, onde as digressões surgem como ondas misantrópicas, como se todos os sons estivessem ali para, determinadamente, “destruir” algo. O Theoria apresenta a disfunção, desconsertando-nos enquanto indivíduos estabelecidos. É de alguma maneira, um reajuste aos ângulos idealizados de se observar a existência e, consecutivamente, viver. Os impulsos apontam demolição, desconstrução- é difícil prever onde estaremos depois e se algo ainda será reconhecível.

O som basicamente é composto de distorções que podem agredir muito quem chega de primeira nas variantes da música industrial. Mas não temam. Essas diversas perspectivas ganham amplitude e densidade enquanto mais nos envolvemos com elas. Não é que não exista um “eixo” central ou “ritmo” que conduza as variantes, mas simplesmente não é entregado ao ouvinte uma linha simplista e metódica de progresso sonoro. Mais do que uma parede de distorções (e acredite, ela fica muito difícil de ser derrubada), há um agrupamento de elementos e uma ideia de composição por trás. Pelo menos eu ouço e avalio dessa maneira. São diversos níveis do “estado” humano, desde um embrutecimento superficial, até ao retorno à introspecção em faixas como Sorry Galera. ‘Vamos Desistir do Brasil’ é uma forma também de “aceitação” da babaquice humana e suas ramificações- os termos da internet, a música popular, o “cover” do Link Park.

Acima de tudo, acredito que se trata de um disco de colapso. Ele pode ter essa superfície de “humor” mais ácido, mas em consecutivas escutadas nós percebemos uma dissociação evidente entre a comédia sarcástica e uma música densa e de confronto. Infelizmente ficou uma merda, faixa que encerra o disco, é baseada na mixagem de músicas de sucesso com uma dissolução corrosiva que abocanha qualquer tentativa de escape. Vamos Desistir do Brasil é arquitetado em cima da perversão e atrito constante entre gestos repelentes de uma sociedade escrota. A faixa homônima, em menos de um minuto, anuncia uma aniquilação completa. As piadas e as tentativas de impeachments são jogadas no mesmo vazio ocioso após um minuto e cinquenta em que parece que nenhuma espécie de sintonia é possível. E ai podemos nos perguntar se as distorções dessa música (e de todas as mais “agressivas” que constituem o disco) expressam um pavor por estar cercado por quem estamos, uma sátira do nível de baixeza que temos que suportar todo dia, ou um simples asco de uma mediocridade em que também tomamos parte. Acredito que de tudo um pouco. Resta ser desagradável, então. Expor os fatos. Rir dos idiotas (mesmo que no fim estes sejam nós). Num Quarto Bolado, quinta faixa, é uma clausura paranoica em que se tenta vislumbrar saídas não tão sadias. São recortes que irrompem e fazem sangrar, para depois morrer novamente, constantemente e gradualmente. Essa intensificação tão contrabalanceada pelos nomes do título, então, não parece tão divergente e até mesmo podemos fazer uma associação. E fica confuso de saber quem é quem, quem se ofende com o que, e que espécie de mundo é esse.


Por sua própria natureza, é difícil fazer uma resenha de Vamos Desistir Do Brasil, porém para mim ficou um pouco inevitável uma vez que eu me peguei ouvindo muito o disco, que é um registro que anuncia a produção significativa de músicas do tipo no Brasil e que é um álbum capaz de estimular. É uma atmosfera opressiva contaminada em grandes doses de humor que também revelam um precipício que atingimos e que talvez tudo isso não tenha volta. Tanto que é árduo “entrar” no disco e suportar suas diversas dissonâncias. Não se trata de um “teatro” de agressividade, é mais complexo que isso. Estamos miseráveis em vários aspectos e o que vamos fazer? Nesse instante, a dor que o Theoria inflige parece ser a necessária para qualquer despertar. Um compadecimento que vamos ter que suportar, porque acordar nem sempre é agradável.

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