Eu fui tão ingênuo na auto-glorificação da introspecção, como se me manter distante fosse algo necessariamente bom e ser inatingível provasse um distanciamento obsceno da realidade. Os dias eram cinzas e sempre regulares, passando em sua monotonia contínua sem nada grande acontecer. Eu me focava em livros e filmes, porque era fácil e confortável o que eu batizava de qualquer bobagem como "desafio intelectual". Era escape. Era medo. Era covardia. Eu tinha esquecido o significado de amar e ser amado, o significado de passar tardes quentes conversando sobre nada e sobre tudo, sobre encontrar nos olhos alheios uma compreensão mútua, uma espécie de abastecimento abstrato que impedia o desastre dos dias, da monotonia e do cinza. Ser alguém que realmente poderia ser amado não era mais uma possibilidade, mas uma realização que eu, aos poucos, percebi enquanto já era capaz, novamente, de retribuir qualquer gesto de gentileza.
Estar perdido na escuridão era o mesmo que estar perdido no egoísmo. Eu esqueci, realmente, se era nutrido pelo isolamento ou se o nutria, se atraia o falecimento múltiplo das expressões ou se eu mesmo era uma expressão ambulante do absoluto nada. Armazenava meus sonhos como impossíveis, como se estivesse muito velho para fazer qualquer coisa que prestasse. Então você me presenteou com olhos compreensivos, com conversas tolas e inteligentes, com uma proximidade inevitável que se delineava cada vez mais, uma transformação pequena a cada dia, um abraço, uma frase, uma bronca. Você me presentou com a coisa mais preciosa:a chance de ser alguém que merecia amor.
Enquanto as lágrimas caiam e eram engolidas pela cachoeira, a cidade distante emoldurava-se como um presente precioso reservado a nós, naquele recôndito de mundo em que nunca imaginaríamos estar, ainda mais juntos. "Você superou a si mesmo", você disse, meio troçando, meio falando sério. Seu sorriso tímido se insinuou enquanto reescrevia quem eu podia ser: alguém capaz de retribuir qualquer gesto de gentileza.
Jim Sumkay |
Quando eu vi você pela primeira vez sobre aquela maca, eu sabia que você teria de sobreviver. Para proporcionar ao mundo tudo aquilo de que era capaz; as risadas, a inteligência e um humor irônico que suavizava qualquer dia abafado, como aqueles muitos que tivemos em certas primaveras. Quando eu vi você no quarto eu fiquei assustado embora o médico garantia que você fosse sobreviver, que era apenas uma intempérie muito menor do que aquelas as quais você tinha enfrentado.
Quando eu voltei à cachoeira onde você disse que eu havia me superado, eu dei uma tímida risada de dor (ou um tímido choro de alegria?). Você testemunhou meu futuro. Era como se você estivesse ao meu lado espectralmente quando eu lembrei suas palavras e lembrei os momentos que passamos juntos como uma única extensão de comunhão.
Eu ouvi sua voz me chamando de novo para correr pelas trilhas, para jogar Dark Souls e cantando Converge. Mostrando que a maior força que eu poderia oferecer seria carregar você pra sempre comigo. Um texto, uma memória ou uma música não trarão você de volta, mas é estranho como eu gosto de pensar que sim
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